Burnout

A Síndrome de Burnout realmente existe e é classificada como doença ocupacional pela OMS. Veja meu relato e entenda a gravidade da doença.

montagem de uma pessoa em sua mesa de trabalho - há um fósforo queimado no lugar da cabeça dessa pessoa
Fonte: Freepik

Você certamente já ouviu falar de “Burnout”, uma das doenças do momento.

O que você talvez não saiba é que o Burnout, ou Síndrome do Esgotamento Profissional, pode te deixar incapaz de trabalhar ou de fazer qualquer outra coisa – obrigatória ou não – no seu dia a dia.

Eu mesmo fiquei alguns bons dias sem conseguir trabalhar. O resultado?

Bem, Fábio,

Devido sua inabilidade de manter conversas continuas e respostas rápidas para prosseguimento do projeto, procuraremos alguém mais bem preparado.

Agradeço desde já.

E-mail de potencial cliente que queria um orçamento

Isso é só um exemplo.

Quer saber como o Burnout pode destruir totalmente a sua vida se você não levá-lo a sério enquanto há tempo? Então senta que lá vem história.

O que é Burnout?

Você já se sentiu tão exausto e desmotivado que até as tarefas mais simples pareciam uma meia-maratona num sol de 48 graus com o asfalto totalmente irregular num solo que pode desabar a qualquer momento?

Se a resposta for “sim”, talvez você tenha se deparado com o tal do Burnout.

Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional é, basicamente, um estado de esgotamento físico, emocional e mental, geralmente causado por períodos prolongados de estresse e sobrecarga no trabalho.

O exemplo que dei acima pode parecer meio absurdo, mas certamente quem já chegou no “nível mais forte” de burnout conseguiu se identificar.

Exemplificando de uma forma mais simples, você já reparou como seu computador ou celular fica mais lento quando está ligado a muito tempo – ou mesmo quando está com a bateria no fim?

Ou então como seus músculos começam a falhar depois de uma série pesada de exercícios? Mesmo que você aumente a pausa entre uma série e outra, o cansaço vai voltar – em alguns casos leva dias pra passar.

Agora, nesses dois cenários, imagine insistir até o limite. Seu computador vai travar, a bateria do celular vai acabar e algum acidente vai rolar na academia.

No caso do Burnout, você quase que literalmente pode parar de funcionar.

Definição

infográfico explicando a Síndrome de Burnout
Ana Paula de Lima / InformaSUS

Não se trata apenas de um dia ruim ou uma semana estressante no trabalho. O Burnout se instala quando esse estresse se torna crônico, levando a um sentimento de exaustão que permeia todos os aspectos da vida.

Não é apenas estar cansado; é sentir-se vazio, sem motivação e muitas vezes desesperançoso e deprimido. Mesmo que você ame seu trabalho.

O termo foi popularizado nos anos 70 pelo psicólogo Herbert Freudenberger, que o utilizou para descrever os efeitos do estresse severo e da alta idealização em “profissões de ajuda”, como médicos e enfermeiros.

Hoje, sabemos que o Burnout pode afetar qualquer um, independente da profissão. Olha eu aqui!

É importante entender que o Burnout não é uma falha pessoal ou um sinal de fraqueza: é, sim, uma resposta compreensível a fatores externos que estão fora do nosso controle.

Digo isso porque com o esgotamento vem o sentimento de culpa por não estar rendendo o suficiente no trabalho, o que leva muita gente a compensar aumentando as horas de serviço diário.

E isso só aumenta o problema.

É como diz aquela frase: “Insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes.”

Sintomas

Identificar o Burnout pode não ser tão simples quanto parece. Afinal, ele se disfarça em meio a rotinas agitadas e estressantes.

Ou seja: às vezes você pode só estar em uma fase estressante no trabalho, que logo vai passar. O problema é quando você pensa exatamente isso, mas na verdade está no início do Burnout.

Como saber, então, se o que você está sentindo é realmente Burnout?

O passo mais óbvio é procurar a ajuda de um profissional (ou seja, um psicólogo). Só alguém especializado poderá confirmar se você tem ou não a doença.

De qualquer forma, alguns pontos a serem levados em consideração para que você avalie se precisa de ajuda são:

  • Esgotamento físico e emocional: A sensação de estar constantemente drenado, sem energia para enfrentar o dia. E aquela exaustão que não passa, mesmo após uma boa noite de sono, é definitivamente um sinal vermelho.
  • Desânimo e negatividade: Se antes você encarava qualquer tarefa com o mínimo de motivação, mas agora tudo parece sem esperança e frustrante… bingo! Uma visão pessimista e a falta de satisfação com suas conquistas podem ser reflexos do Burnout.
  • Problemas de concentração: Dificuldade em manter o foco, esquecimentos frequentes e uma sensação de que a mente está sempre “embaçada” e que as tarefas não chegam ao fim nunca.
  • Irritabilidade: Auto-explicativo, certo? Ficar impaciente, mal-humorado e se sentir no limite de “explodir” com alguém são sintomas também.
  • Isolamento social: A tendência a evitar interações sociais, mesmo aquelas que antes eram prazerosas. Afinal, o mundo parece exigir muito, e a isolação se torna uma forma de autopreservação.
  • Problemas de saúde: Como não poderia deixar de ser, seu corpo começa a cobrar. Insônia, dores de cabeça, dores musculares, alterações no apetite e no peso são alguns dos sintomas físicos que podem surgir.
  • Desempenho profissional reduzido: Conforme comentei mais acima, uma queda na qualidade e na eficiência do trabalho, apesar de mais horas dedicadas, é uma ironia comum do Burnout.

Esses sintomas variam de pessoa para pessoa, como acontece com qualquer outro problema de saúde. Além disso, eles não surgem todos de uma vez, mas se acumulam gradualmente.

Portanto, é essencial estar atento às mudanças sutis no seu comportamento e bem-estar. E se você se reconhece em vários desses sintomas, essa é a hora de parar e refletir sobre seu estilo de vida e carga de trabalho.

Tratamento

Repito: a opção mais viável é contar com a ajuda de um profissional.

Jamais – reforço: JAMAIS – tente se autodiagnosticar e muito menos sair dessa sozinho. Abaixo você verá meu relato e vai perceber que, se fizer isso, só vai piorar a situação.

Em suma, minhas dicas são:

  1. Reconhecimento e aceitação: O primeiro passo é reconhecer que você realmente está passando por uma crise de Burnout. Aceitar que você precisa de uma pausa não é um sinal de fraqueza, mas de força e autoconhecimento. E isso é só o começo.
  2. Busque apoio profissional: A ajuda de um psicólogo é fundamental. Terapias como a cognitivo-comportamental têm se mostrado eficazes no tratamento do Burnout, ajudando a desenvolver estratégias de enfrentamento mais saudáveis.
  3. Reavalie seus limites: Aprender a dizer “não” é essencial. Estabeleça limites saudáveis em sua vida profissional e pessoal para evitar a sobrecarga. Não viva só do trabalho.

De resto, só um profissional vai conseguir analisar sua rotina, seu estilo de vida e o que mais for necessário para recomendar um tratamento.

Seria irresponsável de minha parte escrever uma lista de sugestões para tratar a Síndrome de Esgotamento já que eu não sou terapeuta e não faço ideia de qual é a sua rotina.

Então, não adianta achar que só entrar na academia, ou tomar remédios, ou até mesmo mudar de profissão será a cura para seu Burnout.

E, convenhamos: Se você realmente soubesse o que vai te fazer bem o suficiente pra vencer o Burnout, você nem teria entrado nessa situação.

Relato: O que aconteceu comigo?

Mesmo depois de algumas boas sessões de terapia, é difícil entender quando o Burnout realmente apareceu na minha vida.

Acredito que a semente foi plantada lá pelos meus 13 anos de idade (22 anos atrás). Já os sintomas afloresceram de verdade em 2018 ou 2019.

Mas quando eu comecei a levar a sério, já era tarde demais.

Início

Pra começar, desde a pré-adolescência eu fui moldado para ser uma ferramenta de trabalho. Em pouco tempo eu já tinha que “bater ponto” de segunda a sábado em um trabalho totalmente braçal, que me trouxe algumas alergias e, é claro, que eu odiava fazer.

Até então o que você leu foi uma história comum de um branco da classe média que reclama de barriga cheia, né?! Bom, romantizar “ser responsável logo cedo e ter o privilégio de ter um emprego” também é parte do problema.

Ou você acha que ser privado de ter parte da infância não afeta um pouquinho a cabeça de ninguém?

Me lembro de raros momentos de lazer, até pelo tempo de trabalho compartilhado com a escola – eu sequer tinha um hobby. Nessa época também sempre senti uma pressão sobre “bom uso” do dinheiro: por mais que eu não estivesse em uma situação desconfortável, eu não podia “gastar”.

Então, uma viagem qualquer, que fosse um bate-volta na praia, era apenas um gasto. De tempo, porque eu poderia estar fazendo algo produtivo; e de dinheiro, obviamente.

Mesmo nos dias em que eu estava doente (seja pela alergia ou até mesmo alguma lesão), eu precisava trabalhar. Uma gripe mais séria ou um dedo quebrado eram “frescura”.

Foi assim durante alguns anos. Por isso não é exagero quando digo que fui moldado para ser uma ferramenta de trabalho. Enquanto estivesse acordado, eu tinha que produzir de alguma forma (e não gerar despesas).

Depois de sair de casa (e já com os primeiros sintomas de depressão – mas isso é outra história), eu ainda mantive essa mentalidade durante cerca de 15 anos. Eu já estava moldado daquela forma e não sabia funcionar de outro jeito.

Meio

A vantagem de ter perdido parte da minha infância pra focar em trabalho e estudos é que eu me tornei um ótimo profissional, diga-se.

Em meu primeiro emprego como web designer, por exemplo, não demorou muito para que eu subisse de cargo. Cheguei a ser gerente em uma agência. Depois disso, abri minha própria empresa.

Mas, de novo: sempre me privando de momentos de lazer, e me forçando em uma rotina de trabalho e estudos. Em uma época eu trabalhava na agência (que era relativamente longe de casa), fazia faculdade e ainda era freelancer.

Eu poderia trabalhar 24 horas sem parar com um sorriso no rosto. Eu só sabia fazer aquilo.

Com o tempo, a coisa mudou um pouco. Primeiro, comecei a perder o vigor para trabalhar o tempo todo. Ainda me forçava a trabalhar, claro, mas meu rendimento já não era mais o mesmo.

Em 2018 a ficha começou a cair: eu realmente só estava vivendo pelo trabalho. Toda a falta que eu sentia de descansar – seja sair pra um bar, viajar ou realmente fazer absolutamente nada – não era “frescura”.

A ficha caiu não só com essa minha percepção pelo cansaço gerado pelo trabalho em excesso, mas também graças à terapia, a qual eu fazia por outros motivos (como depressão e ansiedade, outras frescuras).

Não dei a importância devida a esse assunto, e o desgaste começou a aumentar com o passar dos meses.

Como assim, não dei a importância devida? Bom, basicamente eu tentei me virar sozinho. Por conta própria, comecei a ter mais momentos de descanso e lazer, mudei algumas coisas no meu dia a dia e até me afastei de algumas pessoas.

Passar a trabalhar 100% em home office foi uma das minhas decisões pra tentar amenizar parte do problema.

Encarei o Burnout como um momento conturbado. Era como uma dor de cabeça que surgia constantemente e, em vez de eu tentar buscar a causa disso, simplesmente fazia o mínimo para amenizar a dor.

Se minhas contas estão certas, fiquei cerca de 3 anos fazendo malabarismo com minha saúde mental. Mas imagina alguém que não é malabarista tentando fazer malabares: uma hora tudo cai no chão.

Fim

Em 2022 eu já não tinha mais prazer em trabalhar. E, detalhe: eu realmente gosto muito do que faço.

Ainda atendia normalmente meus clientes e não atrasei os prazos, mas as coisas começaram a desandar. Uma resposta mais demorada, um dia de trabalho com rendimento praticamente zerado, vontade de começar a jogar tudo para o alto…

Mas eu estava produzindo mesmo assim. Entregava o que era combinado no final do dia e, se eu achasse que eu rendi menos do que deveria aquele dia, eu trabalhava até precisar parar pra dormir.

Se o trabalho está me fazendo mal, que tal um pouco mais de trabalho então?

No começo de 2023 eu comecei a ter uma dificuldade imensa pra começar o dia de trabalho. Às vezes eu pulava a manhã; ou então tirava a tarde pra me sentir culpado por não trabalhar.

Até que eu comecei a ficar dias sem conseguir trabalhar.

Era sentar na frente do computador e vinha uma sensação de que eu jamais tinha tido uma noite de sono na vida, de que nada tinha importância e de que eu realmente deveria procurar outra profissão. Sem contar as crises de ansiedade.

Esses dias sem trabalhar passaram a ser semanas. Meu recorde foi ficar pelo menos 3 semanas completas apenas respondendo (alguns) e-mails. Era impossível trabalhar.

O resultado disso foi desastroso: atrasei alguns trabalhos, perdi clientes, não fiz um bom atendimento e tive que encarar algumas situações como esse trecho de e-mail que citei no início do texto.

Sim, você não entendeu errado: mesmo morando no trabalho, em alguns dias eu sequer conseguia entrar no meu próprio escritório, cômodo em que eu costumava ficar 10, 12, 16 horas por dia.

Eu jamais imaginava que chegaria a esse ponto. Nunca nem me passou pela cabeça que fosse possível para uma pessoa essa condição de não conseguir trabalhar como se existisse alguma barreira invisível e totalmente angustiante para tanto.

Mas aparentemente existe. E depois de me afundar em uma crise existencial (pra não dizer pior), decidi procurar ajuda.

E agora?

Hoje sinto que o pior já passou, mas ainda há um longo percurso pela frente. Afinal, não é que eu precise voltar ao normal – esse “normal” era totalmente insalubre e me quebrou.

Algumas mudanças – em todos os sentidos – são necessárias, e felizmente já vejo algumas melhorias hoje em dia.

Já consigo ter uma rotina melhor de trabalho, mas ainda mal consigo render metade do que já rendi. O trecho do e-mail no início do texto não me deixa mentir: por mais que eu esteja me esforçando, ainda estou com essa “inabilidade de manter conversas contínuas e respostas rápidas”.

Aliás, esse feedback não me abala por dois motivos:

  1. Era óbvio que isso iria acontecer uma hora. Eu não estava dando conta, e por mais que outras pessoas não saibam pelo que eu estou passando, muita gente não tem o menor tato para lidar com frustrações;
  2. Nesse caso em específico esse cliente em potencial tinha solicitado um tipo de atendimento que eu não faço (o que estava muito claro no momento em que ele entrou em contato pela primeira vez).

Já tenho maturidade o suficiente pra entender que algumas coisas eu realmente não consigo controlar e que é impossível abraçar o mundo e agradar a todos.

Outros feedbacks, sim, fizeram diferença pra mim durante meu pior momento e também durante essa recuperação: empatia e identificação.

Por exemplo, nos dois projetos que atrasei, sugeri até mesmo a negociação de uma multa já que eu não estava conseguindo cumprir com o combinado. Os dois clientes se recusaram a me cobrar (mesmo prejudicados), entendendo completamente a situação.

Recentemente estive conversando em um ritmo muito lento (3, 4 dias para responder um e-mail) com alguns novos clientes que também entenderam muito bem a situação. Zero pressão por parte deles.

Isso, inclusive, também faz parte do tratamento: entender as coisas que não estão sob nosso controle e valorizar o que realmente dá certo. No final das contas, é o que importa.

A verdade é que todo mundo está quebrando

Durante esse tempo que conversei com clientes e prospectos sobre meu estado de saúde que impossibilitava um atendimento rápido e decente, percebi que todos eles tinham algum relato parecido.

Se não Burnout, depressão, ansiedade, anedonia ou algo do tipo. Parece que todo mundo está quebrando ao mesmo tempo.

Até mesmo um amigo do ensino médio está passando por isso. Temos a mesma idade, profissões e rotinas totalmente diferentes.

A nossa rotina hoje em dia é totalmente desumana. O corpo humano não foi feito e nem está preparado para o que a gente tem feito com ele.

E parece que as coisas só tendem a piorar com o aumento dos preços, redução da remuneração, uma guerra atrás da outra, pressões sociais cada vez mais fora da realidade e pessoas cada vez mais preocupadas em produzir como se a vida se resumisse a trabalho.

Trabalhar com internet é oficialmente insalubre

A internet está cada vez mais rápida. Não me refiro à velocidade de conexão, e sim ao seu contexto geral: tudo acontece em uma velocidade impossível de ser acompanhada.

Vale para novas tecnologias, demandas de clientes com projetos online, produção de conteúdo e até mesmo acompanhar atualizações de quem você segue.

Dessa forma, a internet tem ditado a vida de muita gente. Para você ter um portal de conteúdo lucrativo hoje em dia, vai precisar escrever entre 10 e 20 artigos por dia. Mas só você – adicione a mesma quantia para mais alguns redatores.

E conciliar a vida virtual com a vida real está cada vez mais difícil, tanto que já estamos com uma síndrome nova por aí: FOMO (Fear Of Missing Out), que é basicamente o medo de perder alguma atualização na internet – ver todos os stories dos seus amigos, todos os posts de suas páginas favoritas etc.

É como eu disse: o corpo humano não foi feito para isso e é impossível seguir o ritmo da internet em todos os sentidos.

Então, se você se identificou com algo nesse texto: faça uma pausa, nem que seja pra tomar uma água (afinal, a gente precisa de um motivo pra ter uma pausa, não é mesmo?!), e procure ajuda o quanto antes.

Formado em Publicidade e Propaganda e Design de Publicidade, trabalha com web design e desenvolvimento, mas sempre arruma um tempo pra ler, estudar e escrever sobre quase tudo.
2 comentáriosComente
  • Responder

    Informativo e ao mesmo tempo muito autoral.
    Parabéns pelo relato! Contar sua experiência contribui para que outras pessoas possam se enxergar através dela. 😉

    • Responder

      Obrigado, Tamires!

      Compartilhei com alguns amigos e tá todo mundo se identificando mesmo. Tá todo mundo quebrando!

Deixe seu comentário

Veja mais